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A intrusão salina em aquíferos costeiros é uma preocupação crescente em Portugal continental, onde muitos aquíferos próximos do litoral têm enfrentado riscos de salinização devido a fatores como o crescimento urbano, a expansão agrícola intensiva e o aumento da procura de água para consumo humano e industrial. O esgotamento excessivo das reservas subterrâneas, em zonas como o Algarve e algumas áreas litorais das regiões Centro e Alentejo, cria condições propícias para a invasão de água salgada nos aquíferos, ameaçando a qualidade e a quantidade da água doce disponível.
A Relação de Ghyben-Herzberg aplica-se às formações aquíferas não confinadas de Portugal, sugerindo que cada metro de descida do lençol freático pode resultar numa ascensão significativa da água salgada, estimada em cerca de 40 metros. Assim, a gestão sustentável e o controlo das retiradas de água subterrânea são essenciais para evitar a intrusão salina e garantir a integridade dos aquíferos costeiros.
Dessalinização: Uma Solução Controversa
A dessalinização é frequentemente apresentada como uma solução para a escassez de água em regiões costeiras, incluindo áreas em Portugal onde o turismo e a atividade agrícola exercem grande pressão sobre os recursos hídricos. Contudo, o processo de dessalinização apresenta vários desafios e riscos para a saúde humana, para os ecossistemas e para as comunidades costeiras:
Impacto nos Ecossistemas Marinhos: As plantas de dessalinização descarregam salmoura hipersalina, produtos químicos tóxicos e metais pesados no ambiente marinho. Estes subprodutos são frequentemente lançados diretamente nos oceanos, o que pode afetar a biodiversidade local, alterando a salinidade e a temperatura das águas costeiras e perturbando os ecossistemas, incluindo organismos marinhos essenciais à cadeia alimentar. Espécies como fitoplâncton, pequenos crustáceos e peixes são especialmente vulneráveis, e a redução dessas populações pode ter efeitos em cascata, afetando também as comunidades piscatórias de Portugal.
Efeitos para a Saúde Humana: A dessalinização produz água que pode conter vestígios de contaminantes químicos, microplásticos e produtos de desinfecção, como o bromo, que têm potenciais efeitos tóxicos. Estudos indicam que a ingestão de compostos bromados em níveis elevados pode aumentar o risco de problemas de saúde, incluindo distúrbios hormonais e doenças cancerígenas. A presença de tais contaminantes torna a qualidade da água dessalinizada uma preocupação para o consumo humano.
Custos Energéticos e Emissões de Carbono: A dessalinização requer um elevado consumo energético, principalmente para operar processos como a osmose inversa. Em Portugal, onde as fontes de energia ainda incluem uma percentagem significativa de fontes fósseis, o impacto ambiental da dessalinização inclui emissões de gases de efeito estufa, agravando o aquecimento global. Além disso, o elevado custo energético deste processo encarece o abastecimento de água, o que pode torná-lo insustentável e socialmente injusto, afetando as comunidades locais.
Danos às Comunidades e Economias Locais: As comunidades costeiras e agrícolas que dependem de aquíferos de água doce para sustentar as suas atividades, enfrentam consequências diretas da intrusão salina e da dependência da dessalinização. A degradação das reservas de água doce implica o aumento dos custos com a gestão de água, o que afeta diretamente a competitividade agrícola, essencial para a economia rural de Portugal. Além disso, a necessidade de construir infraestruturas de dessalinização pode causar deslocamento de populações e alterações no uso do solo, impactando o turismo e os modos de vida tradicionais.
Estratégias Alternativas para a Gestão da Água em Portugal
Ao invés de depender exclusivamente da dessalinização, é fundamental explorar estratégias de gestão e conservação dos recursos hídricos em Portugal que sejam sustentáveis e eficazes. Algumas alternativas incluem:
Recarga Artificial dos Aquíferos: A implementação de sistemas de armazenamento e recuperação de aquíferos (ASR) permite que a água da chuva ou das linhas de água seja infiltrada nos aquíferos, auxiliando na manutenção do nível do lençol freático e evitando a intrusão salina.
Proteção e Reabilitação de Ecossistemas Naturais: A recuperação de zonas húmidas e de áreas ripárias, ajuda a conservar a qualidade da água e a evitar a salinização, uma vez que estes ecossistemas funcionam como filtros naturais e zonas de recarga para os aquíferos.
Restrição e Monitorização do Uso de Água: Impor restrições às extrações de água em períodos críticos, especialmente no setor agrícola intensivo, aliado a um sistema de monitorização constante da interface água salgada, são medidas essenciais para prevenir a intrusão salina.
Reutilização de Águas Residuais: O reaproveitamento de águas residuais tratadas para fins agrícolas e industriais, pode reduzir a pressão sobre os recursos hídricos subterrâneos e minimizar a necessidade de dessalinização.
Em Suma
Para enfrentar a intrusão salina nos aquíferos costeiros de Portugal e fortalecer a segurança hídrica em sistemas agrícolas intensivos, é vital explorar a integração de técnicas de permacultura que sejam compatíveis com produção agrícola financeiramente rentável. Ao contrário de um enfoque puramente técnico ou infraestrutural, a permacultura oferece uma abordagem prática e adaptável, que, quando bem aplicada, beneficia diretamente tanto a produtividade quanto a resiliência dos recursos hídricos. Sem recorrer a estruturas de elevado custo, como as dessalinizadoras, que impõem sérios riscos ambientais, estas técnicas ajudam a preservar a qualidade e a quantidade da água subterrânea, essencial para a agricultura alongo prazo.
Em sistemas agrícolas que demandam alta produtividade, técnicas inspiradas na permacultura, como valas de infiltração, zonas de captação de água e a diversificação de plantas de cobertura, demonstram ser práticas eficazes e economicamente viáveis. Estas práticas aumentam a capacidade de retenção de água nos solos e fortalecem a sua estrutura, limitando a perda de nutrientes e melhorando a capacidade produtiva do terreno. Além disso, a presença de barreiras vegetativas e de plantas adaptadas ao local, permite o controle de erosão e aumenta a infiltração natural da água, protegendo os lençóis freáticos e diminuindo a vulnerabilidade à intrusão salina.
Do ponto de vista financeiro, a aplicação de técnicas de permacultura reduz a dependência de insumos externos e mitiga a degradação dos solos, o que se traduz em economias substanciais e num retorno de longo prazo mais estável e previsível. A diversificação das culturas e o uso inteligente da paisagem para maximizar a eficiência hídrica, permitem que agricultores obtenham colheitas consistentes e de alta qualidade, mesmo em condições climáticas adversas. Esta abordagem favorece sustentabilidade, que, sem comprometer os aquíferos, é capaz de gerar lucro enquanto responde de forma inteligente às limitações hídricas e aos riscos ecológicos.
Assim, ao adotar princípios de permacultura em sistemas produtivos, os agricultores portugueses não só garantem o uso mais eficaz da água, mas também aumentam a longevidade das suas operações, criando base para sistemas agrícolas resilientes e financeiramente viáveis, que respeitam e valorizam os recursos naturais como ativos essenciais.
